Imagem: The Kiss, de Henri de Toulouse - Lautrec |
Ter
olhos para olhar a vida é o mistério maior: é como passar os braços em volta de
si e sentir o próprio toque; é o impulso da liberdade correndo, voando, aos
pulos!
A vontade, o
desejo suspenso no ar e a ousadia que chega e nos aborda com um quê de “preciso
voar” seguido da tortura que completa “e por que não persegui antes o voo?” são
os ângulos que faltam quando o enquadramento de si já não parece mais se
adaptar ao cenário criado para se ambientar numa ficção sem momentos demarcados.
É o nosso
limite que chega, pede licença e invade a casa com interrogações que não
sabemos de onde tirar a extravagante quantidade de respostas – na maioria das
vezes sem sentido algum, que só se traduzem melhor bem no fundo de um baú para
ser vasculhado sempre num lugar chamado futuro.
Tento olhar
ao redor, encontrar algo que eu possa contar. É mais que ter olhos para ver a
vida passar e se fazer em pequenas histórias ou grandes enredos; é sobretudo
não se render quando se vê – posso dizer que me rendo constantemente, é o que
me faz sentir mais e ser transviada diante da ordem que se instala - mesmo
sabendo que a pose muitas vezes dá corpo à situação e é encantadora.
Uma cena me
vem à cabeça: algo distante, afastado da rua, como se fosse do lado oposto da
vida. Não posso contá-la em detalhes esmiuçados, pois rodaria como no tempo de
um filme, mas existia um prazer que sustentava os minutos que pareciam
intermináveis.
Vi somente o
espaço da janela fechando ferozmente, arranhando a fechadura – como se não quisesse mostrar seus inquilinos.
Ali, ocorreu-me a sensação de que tramitavam os gestos com a visão do algo não
resolvido, mas que estava ali com toda a sua força e imensidão.
O vento que
continuava a bater tão forte e inusitado, quase que deixava as palavras em
confusão por entre seus sussurros variados - como todos os atos que podiam ser
encenados naquela rua da frente, a esconder seus moradores por entre as frestas
das janelas escurecidas pelas cores que impregnavam as paredes já desgastadas.
Eles estavam
grudados, segurados entre as mãos, com um choro incontido, mas gritavam com
todas as suas forças e explicavam que tudo estava resolvido; da garganta já não
saia o ar que necessitavam, porque se abraçavam como se fossem um só, e não
havia mais nenhuma necessidade das palavras.
***
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