Decidimos partir à tarde,
não muito cedo, nem próximo ao crepúsculo, pois ainda tínhamos mais planos para
o fim do dia.
Não pude me conter ao
pensar que nosso destino era a colônia das múltiplas linguagens que teríamos
que usar para transpassar os limites do olhar – íamos para o zoológico! Quis
ver o passeio – ou aventura – pelo meu reino fantástico da psicologia
espiritual, que tenho tentado me aperfeiçoar a cada dia, como a experiência do
contato – essa incrível capacidade que faz os mais sensíveis e impressionáveis
seres pagarem um preço elevado pelo que acreditam no ambiente do espetáculo.
Sempre soube que no
zoológico ficam expostos para visitação – como nas vitrines de lojas, desde as
mais modestas até as de grifes luxuosas, animais de espécies, gêneros, famílias
e todas as nomenclaturas científicas que os organizam numa classificação
harmônica que define o reino ao qual pertencem.
A enigmática diferença de
tudo para mim está no ato de ver, se toco o ser ou o que está impregnado dele,
já faço parte do que sinto, mesmo que de espectadora da sua continuidade ainda
não revelada – é que não se pode saber do próximo passo, qual o sentido de rumo
que ele tomará, nem nas próximas horas.
Fui tomada, à entrada, em
que se estendia um grande e explicativo mapa-roteiro para encontrar os grupos
de animais que podiam despertar o interesse do visitante – naquele momento, o
nosso – então já digo que me senti instigada por todos, pois imaginar formas de
vida e comunicação é o que me tem feito escrever ou pensar como se escreveria
isto ou aquilo.
Na primeira rota que
escolhemos, para ver os animais de grande porte, ainda não sabia o que sentir –
não era apenas curiosidade, era quase o medo de sair sufocada por uma falta de
liberdade. Os animais estavam presos, exibidos, expostos a qualquer olhar que
não se pode mensurar o nível de bondade ou crueza – estavam longe do seu
habitat natural, presos em jaulas, inescapáveis.
O espetáculo é o que
atrai, o diferente mobiliza e até bestializa o ser humano – vi muitas pessoas
tentando imitar caras, bocas e até uivos que pudessem chamar a atenção dos
animais, que pareciam estar numa crise de mau humor.
Andamos bastante, de
grupo em grupo, vez por outra uma olhada no trajeto – primeiro aqui, depois o
outro -, e assim passamos a maior parte da tarde. Nada parecia mais novidade –
a graça havia no charme sem pretensão dos animais -, era tudo quase como um
grande circo que tinha seus números em horário marcado para apresentação – acho
que fiquei farta de ver belezas na sociedade do espetáculo para satisfazerem os
olhares que pagavam caro por algumas horas de atrações.
Desejaria mesmo saber que
todos aqueles animais estariam logo em seus espaços e linguagens originais,
pois eles vinham de várias partes dos continentes e parecia que ali, estavam
somente à espera da liberdade – queriam saber que eram livres em suas
naturezas.
Foi o que pude sentir,
sem toques, apenas com o olhar que me fazia entender o universo incomprimível
do outro, pois a grandeza se mostra mais no que não está aparente, mas no que
se oculta na carne. Não sabia se sofria, se olhava com
a alma embotada e sufocada, ou se o que via era um misto de redenção e do que
sempre desejei sentir diante do traço disforme que passa por mim, separado
apenas pelo meio-fio, que parece falar o que eu não gostaria de escutar. Mas já
se falou, sentiu, e não se pode voltar atrás.
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