Mudei-me para
um lugar aparentemente tranquilo. Vejo as pessoas em ritmo, que trabalham, passeiam e que conversam sobre coisas do dia a dia. A rua não diz muito dos
seus moradores, podem morar aqui todos os tipos humanos – suas ruas estão
dentro das casas, acredito - o que confesso que me atrai terrivelmente -,
principalmente quando os vejo por trás das vidraças que se esparramam formando
uma fina cortina sobre a luz noturna.
As árvores aqui, assim como a rua,
possuem um cheiro agradável e leve, de hortências floridas e dançantes no
verão. Mas aqui já é inverno e os caules grossos das árvores úmidas têm cheiro
de um vinho jovem e sedutor que fala
palavras indiscretas ao fim do dia.
Dá para escrever daqui, de um
janelão de três metros, do alto de um terceiro andar... penso que ele fez a
descoberta de mim, como um casulo que
explode todos os dias e não se conhece, é que as vezes não sei escrever ou não
desejo saber desse desconhecido, pois existe o medo que bate à porta – que eu
não abro! É o hábito de andar e pensar e escrever em volta de janelas que me
define como uma pessoa inquieta e sem medidas. Na verdade nem sei ao certo como
se define tudo; se às vezes leio sobre algo, me vem uma torrente de dúvidas que
me levam para mais aventuras e novos fôlegos que me causam uma animosidade
esquisita.
As histórias se mesclam com partes
do que se vive e do que se acredita do real, ou mesmo do que se escreve e tira
dos personagens, que falam com o delicado tom da voz humana. Pode ser a ficção
que vivemos e damos tons diferentes em outras peles do que não se pode inventar.
Nem os começos podem se fartar da grandeza das primeiras experiências.
Tiro desses delicados e profundos
pensamentos o intenso desejo de viver, como os habitantes do mundo que se
instalam dentro de mim em estações alternadas, ora gélidas, introspectivas,
sozinhas, cultas, ora esfuziantes, loucas, gritantes! que se apresentam para
mim como a exclusividade da criação humana; e surge um grito, sonoro e inquieto
cada vez que o ser olha bem dentro dos seus olhos brilhantes: “sou eu a criação
humana que foge da vida, mas que trama sufocá-la ardentemente”.
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