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quinta-feira, 30 de maio de 2013

Tipos Humanos


Imagem:http://mundodadanca1.blogspot.com/2010/10/danca-das-sombras.html




Aprecio os tipos humanos! Aqueles cuja consciência beira a loucura e seus gritos se confundem com os gemidos da noite. 


A plasticidade de suas almas, que é a dimensão única de seus universos desconhecidos, pleiteia o risco de descortinar suas faces para os arquétipos humanos normais. Sim, a humanidade está cheia e cansada destes tipos e eu, como parte desse estopim de mentiras, também estou arruinada por essa normalidade revestida pela orgulhosa sanidade!


A questão maior é que não conseguimos conviver muito tempo com a mesmice das coisas - o que aparentemente se diz normal -, somos acostumados a enxergar uma anormalidade que não passa de um equívoco de humanos. A normalidade de que falo, desses meus tipos preferidos de loucos, é a que concebe o mundo como sendo a maior mágica e descoberta do homem; a que, de tão íntegra, é a mais humana das loucuras. 


A convivência com esse tipo de loucura acaba arruinando a liberdade, o respeito mútuo e o cuidado obsessivo. Quem de nós não nos revoltamos quando somos relegados a um segundo ou terceiro plano? Poderíamos falar em egoísmo, avareza, hipocrisia, mas eu, por ora, não julgaria assim. Falo de uma necessidade maior, ou puramente de necessidade. Essa inquietação por uma atenção desmedida, carinho de todos os dias e preocupação constante são o que trazem para nós as armadilhas do rancor e das traições mais absurdas.


Humanos em si e nas loucuras suas e dos outros. A absorção da camada superficial e latente, muitas vezes não permeia a insanidade que se aninha no mais profundo de seus eus. A isto eu não conceberia somente como desregrados, mas diria que suas vidas são tão insuficientes quanto o esmiuçar de suas almas. 


A esse fantoche de súbitas aparições nessa dimensão, por certo superior, como dizem os espíritas, que se deixam levar pela inundação de suas lágrimas em dias nebulosos, tenho o prazer de apresentar a sublime dor humana que conheço tão bem quanto suas almas banhadas pelas palavras mais banais: existir! 


Este verbo ambíguo, de teor suave e sabor encorpado, causa-nos angústia, inconstância, dissabores e, consequentemente, a morte súbita de nossas aspirações incompreendidas. 


     E o, "Cogito, ergo sum", do imortal filósofo francês, René Descartes (1596 - 1650), ao duvidar de sua própria existência, também nos apresenta a inquietação maior de sua conclusão: se penso, tenho conhecimento e, portanto, em minha consciência, existo!



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quarta-feira, 22 de maio de 2013

A Escritora urgente


Imagem:http://www.wanderlino.com.br/cronicas/cronicas/88.html




 Decidi escrever. Fazer de mim um som nítido e perverso, que se pode ouvir no tilintar das horas. É estranha a sensação degustada, quase eufórica, de se ver no reboliço da aparência e da importância que damos as coisas; de como devoramos nossos impulsos impensados – o eco que nomeamos internamente de irracionalidade ou irrealidade cotidiana.

Nesta noite, que falo coisas errantes e faço-me escutar por entre meus fragmentos de palavras, sou a escritora que se capta em uma espécie de silêncio o terror da existência fugaz e o modo incrédulo como muitos levam suas vidas - incrédulos de si, não sabem a respeito, ou não desejam saber, da suprema natureza do infinito. 

A felicidade me aflige, constantemente. Ela, não é mais que o momento oportuno em que guiamos nossos instintos para a busca de algo desconhecido, que não sabemos nomear ou descrever secretamente pelo intermédio fascinante das palavras. Este estado de ser, a busca por alguns instantes do absoluto, é o oposto da comédia que se instala no trágico impossível diante dos acontecimentos e dos atos vis que costumo presenciar com tamanha indignação – pois eles, os atos de que falo, manifestam-se como a alma corrupta que escapa do sangue pastoso, sem cor definida, formas, ou nome próprio.

O que é o impulso humano que joga para a cena a face verdadeira da alma? Algo como uma arquitetura arranjada e predestinada – um conceito próprio do ser. Ao mesmo tempo, figura como o esqueleto flechado, dosado de entranhas reais, visíveis, imorais, corruptas, a mistura revolta em ambiguidades; o tudo, o princípio, o nada, o meio, o medo, a redenção, o fim; intempestivamente, a retomada para os ciclos invisíveis que cada homem que manifesta seus instintos inconfessáveis adquire diante do trono de sonhos que constrói em sua busca do equilíbrio e das respostas que aspiram encontrar.

Existe uma falta - do equilíbrio, que se vai constantemente. E dessa falta, surgem as histórias em suas cores e tons psicológicos que porventura não se pode desvendar por completo – penso que é o mistério que se desenha em sua forma nua, em revolta, à espreita de ver, avidamente, a alma com algum resquício, revestida de cores vibrantes.

Dessas sensações arbitrárias, como sentenças de morte mal planejadas, são os dias vividos da escritora urgente. Para ela, a crueza dos pensamentos e as visões curtas e reais não transmitem tons vívidos, mas destoam olhares, sabores, toques, a sutil espécie da imaginação humana, que, de suprema criadora das coisas, também é destruidora da natureza infinita do homem. Resta, à escritora, escrever e subtrair do todo o enigma das palavras.

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domingo, 19 de maio de 2013

Dados dourados



              
uma música dentro da outra
Foto: Sérgio Pavanello



              Eles tinham possivelmente uma cor sólida, de uma quentura indizível. Mais pareciam braços entrelaçados no calor de uma madrugada de verão, em que só o brilho condensado de uma lua cheia molharia os amantes inconscientes. Mas, para que uma descrição cheia de fantasias, se me veio à tona coisas tão reais e corruptíveis que invadiram nosso café da manhã, manchando de verdades tão vergonhosas que aparecem nas páginas dos jornais diários, notícias televisivas ou entre os papos corriqueiros que embelezam o contato dos humanos.


                 Estes são os dados dourados! Uma percepção inquietante da magnífica jóia que perpassa a vida: o jogo esmiuçado do ser humano em si, aplaudido e coberto pelos holofotes gigantes do inebriante do universo.


                Das peças hiperbólicas, varandas manchadas pelo vinho noturno, folhas rabiscadas em busca de sentido e, de forma mais efusiva, do avesso da pele e suas contradições, transfiguram-se paixões obscuras que roubam as faces alheias.


                Em mundos coloridos não existem regras, mas interfaces de loucuras! Dados dourados, partidas, fases dos jogos: assim como no submundo das mais variadas espécies vivas ou que emanam a energia vibrante em sua composição ao universo; que sequer se importa acerca das elucubrações acerca da ordem das coisas - somente ordenar seu ciclo de dias e noites, mortes e nascimentos, mentiras e verdades, loucura e sanidade, ódio e amor -, valendo-se ainda de ambiguidades vazias, da criação da coisa em si, corruptível.


                A vida é um grande jogo, permeada pelas incertezas que arrebentam sua correnteza, e vale pensar de qual lado se está mais apto a jogar, afinal, o ser humano é e sempre será sua peça principal, o curinga ou o truque mais barato do qual o indivíduo se dá como o grande vencedor, ou o protagonista de seu palco melodramático e inconstante.



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sexta-feira, 17 de maio de 2013

Quando vêm os sonhos

Imagem: http://www.greekmyths-greekmythology.com/morpheus-the-god-of-dreams/
  


Outra porta escancarada. Confesso que não tenho medo de assombrações humanas, embora o mundo dos sonhos me traga as histórias mais bizarras - que nem ouso imaginar, quando sou livre, para a construção das minhas torres interiores.

- O que é isso, deus dos meus dias? O que são estes sonhos que se confundem com a vida que acredito e tenho por real, como a parte verossímil de mim; o lugar que se ergue em fantasias, e traz algo inteligível para que meus passos não se confundam no lapso de minhas confusões. 

Ando por uma espaçosa casa, de vãos claros e vasta mobília, de sótão e porão, de varandas que dá para um bosque - sua imensidão causa medo -, medo de quê? Ainda não sei. Se é real, parte como algo inexplorado dentro de mim, talvez seja essa a razão psicológica ou minha autoexplicação da ficção que os sonhos arquitetam.   - E quando a mobília, a casa, o dia de chuva e os raios de sol não são reais? Terei de saber da suprema realidade das coisas?

Vi um dia desses um escritor que perambulava pela rua vendendo sua obra, não parecia muito feliz, mas trazia um agradável semblante, de quem escreveu a história dos outros e disse tudo a respeito da condição humana.  - Pensei: eis o poeta de alma nua. Também não ouso dizer que essa imagem delineada da pobre criatura seja real. Há mundos imersos dentro de mim, que saem, vagabundeiam, voam pelos espaços ermos, e não são reais como desejaria que fossem.

Povoados são meus universos paralelos, que atuam e fazem do real o eco experimentado pela sensibilidade caótica que alguns personagens mais aguçados trazem dentro de si, e se salvam em suas próprias armadilhas, para espantar o caos que sobrevive inalterado no enredo das horas. 

De onde vêm os sonhos e as cores encantadoras e cruéis que montam e juntam seus palcos opostos? - Sei que os meus brotam de dentro de mim, sem medidas, espaçosos, permissivos, que não bastam em seus devaneios. Sinto que são únicos e suspensos por uma ponte que liga minha realidade ao infinito inconfessável que temo revelar. Eles vêm à noite ou a qualquer momento que encontram seus portais abertos; ficam à espreita e se portam como nuvens carregadas em suas tonalidades escuras, borradas com pincéis surrados pela exatidão dos traços, como a vida que carrega suas histórias - sem cortes.

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quarta-feira, 15 de maio de 2013

A Loucura como presente




Imagem do Artista Plástico Eulâmpio Neto -http://www.eulampio.com/index.php?lang=pt


Alguns presentes são tão raros e especiais pelo simples fato de estarem além de nós. O invisível, o escapável, o fugidio é o que nos deixa ansiosos pela possível descoberta do grande dia. 

A essa altura, queridos amadores da vida, alguém está a se perguntar o porquê de elucidar uma conversa, talvez um pouco complexa, acerca de um "presente". O presente de que falo não é daqueles que a gente ganha, embalados em caixinhas coloridas e fitas de cetim, no dia do nosso esperado aniversário ou outra ocasião especial. Falo do presente que mais surpreendeu meus olhos numa manhã de 29 de outubro.

Para mim o dia despontou como sempre - igual a todos. Mas neste dia, talvez acompanhada de uma percepção mais sensível, vi que havia um pouco de mistério no balançar das árvores que, ora pareciam flutuar, ora arrastar-se pelo mundo, carregando o peso da loucura humana.  - Foi uma sensação estranha. Havia um dia lindo e um pouco nublado, daqueles que encantam a gente com a batida calma da natureza. 

Fui, literalmente, impulsionada a sair de casa e dedicar um pouco do meu tempo a algo que não estaria muito distante dali. Lembro que, ao girar a maçaneta e sair em direção a esse invisível que já estava aos gritos, uma sensação pulsante de loucura atacara minha mente. Eu, sempre amante dos discursos sobre a loucura, esse raio incontrolável do ser humano, mas tão vital e escapável que, uma simples aproximação entre nós (a loucura e eu), poderia levar minha alma para sempre embora deste mundo tedioso e insuportável, como se esvaia diante de mim. 

A caminho da biblioteca - nesse dia que eu desejara tanto estar em outro lugar do mundo, talvez perdida em algum ponto do Universo -, mas em contato com minha própria carne, escapando desse mundo insensível e esmagador, percebi o trajeto diário banal de minha vida, do amanhecer ao anoitecer. Não aprendi a me conformar com a mesmice das coisas - a vida para mim não basta em si mesma ou aceitar as coisas como são e não como deveriam ser, é desde sempre uma masmorra de inconstâncias e lutas internas.

Ao chegar à biblioteca e desembalar meus livros sobre a mesa, correu-me um raio de curiosidade para subir mais um degrau - achei que não estava confortável naquele lugar costumeiro de estudos, o qual me era tão familiar. Avancei, vagarosamente, até encontrar uma mesinha, num lugar de pouca luz, mas que serviria para eu recostar a cabeça por um tempo e pensar um pouco sobre o que transcorrera durante aqueles anos que se passaram, tão cheios de sonhos e projetos ainda por realizar.

Mas, eis que uma súbita inquietação estremeceu minhas pernas e me fizeram perscrutar o lugar para onde fora, com receios e ansiosa pela descoberta. Soubera, ao longo daquele caminho, que a manhã não passaria incólume a um dia tão estranho, mas único. 

Ao dar os primeiros passos, enveredei por um pequeno labirinto de livros velhos e empoeirados, desgastados pelo conhecimento adormecido dos grandes homens, que deveriam dedicar mais seus suspiros às coisas que verdadeiramente importam: as que superam a vida em seu tamanho.
Passando pela galeria de exposições, deparei-me com um trabalho excepcionalmente humano, sublime em loucura, dor, medo, grito, sussurro, angústia, saudade, decepção, desassossego, incerteza, remorso, solidão... os sentimentos mais dolorosos e aprisionantes que o ser humanos pode construir.
 - Eulâmpio, era esse o nome do gênio criador. Soubera incrustar em suas esculturas de terracota as sensações que eu me deparara todos os dias, seja ao sentir a decepção e os olhos rasos d'água das pessoas ou beber de minha dor infinda.

Diante de tantos personagens arrebentados pelos sussurros da loucura, vi-me diante da história sem fim do ser humano; vi, em cada rosto, veias a escorrerem pelos pescoços magricelos de seres sem vida, de pura argila, mas de espíritos tão humanos quanto o meu. Para cada dose de loucura e suas infinitas sensações, havia um título para retratar a expressão pesada que pousava em cada rosto.

Vi realmente que a vida guardara um presente de grandes responsabilidades para mim - passar para as pessoas suas faces nuas e suas doses de loucura de todos os dias não é tarefa fácil, muito menos humana. É algo que exige o despertar de algo maior, que não arranja lugar dentro de nosso corpo coberto de loucuras pelas sensações que o mundo nos causa.

A partir daquele momento tilintante em minha alma, as histórias daquelas criaturas começaram a adquirir formas naquelas folhas tão brancas que guardara dentro de um caderno pouco rabiscado. Seus sentimentos estavam entrelaçados por vivências distintas e por uma loucura constante, desmedida.

Meu presente de aniversário tomava formas cada vez que roubava por direito um título da loucura - o presente que mais parecia um grande trabalho, corria por entre meus dedos a sapriscar a tinta no papel como a vida que flui nas crianças em dias de passeio no parque.

Eram muitos personagens tomados pelas sensações que eu degustava freneticamente - tomei consciência que havia treze seres angustiados pelas loucuras e que, como recompensa, eu teria que trazer treze vidas repletas de histórias que pudessem exprimir o motivo de suas loucuras tão vis. Suas histórias não eram estranhas; ecoavam os longos suspiros dos gritos ritmados, todos juntos.

Aquelas vidas entrelaçadas pela loucura mostraram-me a forma translúcida do presente que a vida reservara - decidi escrever a história mágica de todos aqueles seres que ainda estavam por vir a este mundo cheio de incertezas e temores.

Treze poesias foram escritas, infladas de muitas loucuras e palpitações. As idéias transitavam de uma ponta a outra, desesperadas, não me deixavam descansar ou sequer pensar no arranjo de meus versos, apenas surgiam, nuas e sem pudores. Em poucas horas, ali estava meu presente raro, singelo e de um valor inestimável. 

Havia diante de mim e das infindáveis vidas que flutuavam loucas em minha frente - para eu juntá-las em fórmulas perfeitas -, o cálculo exato que não sei de onde, viera parar em minhas mãos.

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