Foto: Sérgio Pavanello |
Intimidades de uma escritora, como ouso
pronunciar, é o mundo em que vivo, que penso e que crio – ora, quantos quês! Há,
dentro das palavras – digo agora, minhas palavras -, a superfície de um corpo
que acode a dança das substâncias fragmentadas. Criei um impasse porque tenho
uma história construída no interior desnudado da linguagem: minha forma de
comunicação que parte de mim para o mundo, ou será algo centrípeto, que parte,
célere, para o quadro inquieto de minha existência?
Sou feita dos laços. Confesso que gosto
mais, dos humanos; são os que encantam, machucam, fascinam e comovem a alma,
como uma espécie de brisa que logo é transformada no redemoinho das palavras
soltas.
Imagino os lugares sem as pessoas ao
redor, sem o surto das composições impensadas; sem as emoções que surgem às
avessas; sem as explicações extravagantes; sem a face poética dos atores que as
sentem, irresponsáveis de si, arrancados pelo apelo arredio da presença dos
outros - os freqüentadores do universo agitado pela turbulência dos vizinhos
anônimos. Desses mundos paralelos que imagino, faço reais suas existências,
busco a urgência maior das coisas: da música, da poesia, do enigma que é viver
todos os dias; entender o descompasso do tempo que urge com a freqüência
despudorada da prostituta das ruas.
Sim, as pessoas são as essências, os
reveses, as simbioses. Compõem universos: dos loucos, normais, mortais,
imortais; transeuntes do verão, caçadoras dos outonos e invernos gelados.
Adoram, por assim dizer, contar os causos secretos do vizinho que é visto todos
os dias às cinco da manhã, do quarto dos fundos; alguns, veem, inventam,
outros, até imaginam as cenas que só existem esparsas e envolventes em suas
crônicas diárias.
Particularmente, desejaria escrever na
maior parte do tempo, para ver o resultado da decomposição exausta da minha
alma; do mundo exalando a solidão como sentença de morte; do meu quadro
incomensurável de analista melancólica das palavras desorganizadas. Assim,
penso que existo; que sou de formas, conjecturas, exigências que logo passarão,
porque amanhã é necessariamente meu outro dia, e já não serão somente minhas
inquietações à mostra... é um corpo nu, de charme diabólico, provocante, que
brotará das fantásticas histórias que assombrarão o mundo real e palpável.
Nas entrelinhas que descem e se escondem
no fundo sombrio do papel, a mão logo é encontrada no fundo da raiz dos
cabelos, à procura, de algo, do quê, do encontro de si, da pessoa-personagem
com as palavras; não mais da ausência, do medo do não sentir. Escrever e
descrever o que sinto, de forma suprema, como a eterna escritora que vive do
mundo, em sua órbita de contos, novelas, ficções, crônicas e tudo que diz
respeito à sua forma de existir.
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