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quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

O deus de pedra com a rosa na mão




Entre gárgulas voadoras e imagens humanas ricamente esculpidas em ouro nos tons dourado e vermelho, olhos em chamas cintilando as coloridas pedras preciosas, esperava taciturno e provocativo em seus desejos, o demônio, que expressava a desenvoltura de um príncipe das trevas com uma rosa venenosa em forma de carne e cor-vermelho-carne nas mãos; portava-se com um esmerado sorriso cínico no rosto e uma postura ereta de um nobre da corte de cavaleiros medievais.



Seus olhos continuavam verdes, tão leves, mareados, vívidos; seu corpo, quase desenhado pela neblina que caia na rua naquele momento do sonho, mostrava com intensidade de movimento, que conquistara sua corte logo após a tumultuada partida. Inúmeras foram as tentativas tramadas por ele, existia um ato, era sua morte suprema, o fim do aniquilamento da sua consciência privada em sua órbita desigual, incompleta, seu caos interior – o que, para ele, representava a liberdade irrestrita do seu ser em um mundo imaginado e transformado em seus ideiais.



Virou-se para mim em tom misterioso, e seus olhos monstruosos e caros como a mais sublime esmeralda apontaram na direção de um mensageiro tão ricamente provido de beleza etérea, que evitei-os loucamente; vesti um  riso estranho e uma alegria descomunal, ao desvendar o conteúdo supremo da mensagem que eu recebi em forma de convite, como presente ofertado do deus de pedra, com quem sonhara algumas vezes, talvez em noites de tremendas agitações interiores, em que meu corpo parecia sempre procurar um abrigo em outras dimensões, distante do ser que me era a fonte de todas as convocações conscientes e subliminares, o que me fazia estar viva, incompleta, sempre em busca do absoluto que se encontra nas artes como a poesia, a música, a escultura e a pintura .



Passou a compactuar em mim, de forma muito consciente, o que se poderia chamar de minha forma divina e jovial de existir, para sempre, diante de tronos, charmes obsequiosos e olhos oblíquos em chamas ardentes. Era um mundo incontável, que era denso, substancioso e tinha formas encantadoras para todos os desejos que se pode imaginar. Era um mundo para os convites e escárnio da pele que se forma no humano, tão doce, leve, faustoso – um berço para o sutil veneno que corre nas veias, quando os desejos mais estranhos ganham o êxtase fatal e flutuam com rodopios desconcertantes no ar que se respira, e suga dele a ebriedade que se condensa na suprema liberdade do corpo e seus desejos mais sórdidos.



                Ele, o deus de pedra com a rosa na mão era, de fato, o demônio que inebriava minhas noites, trazendo alucinações tão reais que a incrível lembrança dos acontecimentos, revelava-me detalhes tão deliciosos, que eu nutria o ardente desejo, nos momentos de vaguidão, a possibilidade de sua existência nos sonhos seguintes – vindo, sorrateiro, sem escrúpulos, trazendo apenas seus encantadores olhos verdes e vestindo seu refinado casaco preto, ornado com maliciosos detalhes vermelhos de cetim e a flor brilhante cuidadosamente encaixada na lapela, afirmando seu bom gosto inquestionável.



 



                                           ***

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