O deus de pedra com a rosa na mão
Entre gárgulas voadoras e imagens humanas
ricamente esculpidas em ouro nos tons dourado e vermelho, olhos em chamas
cintilando as coloridas pedras preciosas, esperava taciturno e provocativo em
seus desejos, o demônio, que expressava a desenvoltura de um príncipe das
trevas com uma rosa venenosa em forma de carne e cor-vermelho-carne nas mãos;
portava-se com um esmerado sorriso cínico no rosto e uma postura ereta de um
nobre da corte de cavaleiros medievais.
Seus olhos continuavam verdes, tão leves,
mareados, vívidos; seu corpo, quase desenhado pela neblina que caia na rua
naquele momento do sonho, mostrava com intensidade de movimento, que
conquistara sua corte logo após a tumultuada partida. Inúmeras foram as
tentativas tramadas por ele, existia um ato, era sua morte suprema, o fim do
aniquilamento da sua consciência privada em sua órbita desigual, incompleta,
seu caos interior – o que, para ele, representava a liberdade irrestrita do seu
ser em um mundo imaginado e transformado em seus ideiais.
Virou-se para mim em tom misterioso, e
seus olhos monstruosos e caros como a mais sublime esmeralda apontaram na
direção de um mensageiro tão ricamente provido de beleza etérea, que evitei-os
loucamente; vesti um riso estranho e uma
alegria descomunal, ao desvendar o conteúdo supremo da mensagem que eu recebi
em forma de convite, como presente ofertado do deus de pedra, com quem sonhara
algumas vezes, talvez em noites de tremendas agitações interiores, em que meu
corpo parecia sempre procurar um abrigo em outras dimensões, distante do ser
que me era a fonte de todas as convocações conscientes e subliminares, o que me
fazia estar viva, incompleta, sempre em busca do absoluto que se encontra nas
artes como a poesia, a música, a escultura e a pintura .
Passou a compactuar em mim, de forma muito
consciente, o que se poderia chamar de minha forma divina e jovial de existir,
para sempre, diante de tronos, charmes obsequiosos e olhos oblíquos em chamas
ardentes. Era um mundo incontável, que era denso, substancioso e tinha formas
encantadoras para todos os desejos que se pode imaginar. Era um mundo para os
convites e escárnio da pele que se forma no humano, tão doce, leve, faustoso –
um berço para o sutil veneno que corre nas veias, quando os desejos mais
estranhos ganham o êxtase fatal e flutuam com rodopios desconcertantes no ar
que se respira, e suga dele a ebriedade que se condensa na suprema liberdade do
corpo e seus desejos mais sórdidos.
Ele, o
deus de pedra com a rosa na mão era, de fato, o demônio que inebriava minhas
noites, trazendo alucinações tão reais que a incrível lembrança dos
acontecimentos, revelava-me detalhes tão deliciosos, que eu nutria o ardente
desejo, nos momentos de vaguidão, a possibilidade de sua existência nos sonhos
seguintes – vindo, sorrateiro, sem escrúpulos, trazendo apenas seus
encantadores olhos verdes e vestindo seu refinado casaco preto, ornado com
maliciosos detalhes vermelhos de cetim e a flor brilhante cuidadosamente
encaixada na lapela, afirmando seu bom gosto inquestionável.
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