Pintura de Edouard Vuillard: Kimono Ma Seer |
Sou feita dos laços. Confesso que gosto
mais, dos humanos; são os que encantam, machucam, fascinam e comovem a alma,
como uma espécie de brisa que logo é transformada no redemoinho das palavras
soltas.
Imagino os lugares sem as pessoas ao
redor, sem o surto das composições impensadas; sem as emoções que surgem às
avessas; sem as explicações extravagantes; sem a face poética dos atores que as
sentem, irresponsáveis de si, arrancados pelo apelo arredio da presença dos
outros - os frequentadores do universo agitado pela turbulência dos vizinhos anônimos.
Sim, as pessoas são as essências, os
reveses, as simbioses. Compõem universos: dos loucos, normais, mortais,
imortais; transeuntes do verão, caçadoras dos outonos e invernos gelados. Adoram,
por assim dizer, contar os causos secretos do vizinho que é visto todos os dias
às cinco da manhã, do quarto dos fundos; alguns, veem, inventam, outros, até
imaginam as cenas que só existem esparsas e envolventes em suas crônicas
diárias.
Nos mundos paralelos que imagino, faço reais
suas existências, busco a urgência maior das coisas: da música, da poesia, do enigma
que é viver todos os dias; entender o descompasso do tempo que urge com a
frequência despudorada da prostituta das ruas.
Particularmente, desejaria escrever na
maior parte do tempo, para ver o resultado da decomposição exausta da minha
alma; do mundo exalando a solidão como sentença de morte; do meu quadro incomensurável
de analista melancólica das palavras desorganizadas. Assim, penso que existo;
que sou de formas, conjecturas, exigências que logo passarão, porque amanhã é
necessariamente meu outro dia, e já não serão só minhas inquietações à
mostra... é um corpo nu, de charme diabólico, provocante, que brotará das
fantásticas histórias que assombrarão o mundo real e palpável.
Nas entrelinhas que descem e se escondem no
fundo sombrio do papel, a mão logo é encontrada no fundo da raíz dos cabelos, à
procura, de algo, do quê, do encontro de si, da pessoa-personagem com as
palavras; não mais da ausência, do medo do não sentir.
Escrever o que digo, de forma suprema,
como a eterna escritora que vive do mundo, em sua órbita de contos, novelas,
ficções, crônicas e tudo que diz respeito à sua forma de existir.
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